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segunda-feira, 2 de maio de 2011

Um dia de chuva


Hoje o dia se transmutou à tardinha.
E fez transbordar as calçadas vazias.
As águas foram chegando bem devagar.
Gota a gota.
E um céu aberto se viu tomado por nuvens fortes e intensas.
De cores vivas. Adoro cores vivas...
O céu ficou banhado por uma cor cinza.
Um cinza vivo. Azul, tão azul que só deixava de ser cinza-azul quando vinha um relâmpago e abria o céu, incendiando-o com um estampido.

Da varanda do meu apartamento eu vi a alegria.
A alegria das plantinhas sem dono que carecem dos cuidados do tempo.
A alegria das crianças chutando poças d’água.
A alegria das cobertas esquecidas nas camas sonolentas...
E os espelhos cobertos me fizeram lembrar o meu tempo de menino no interior e me voltaram para o meu interior.

Hoje foi um dia de paz.
De só querer ouvir e contar os trovões.
De sentir aquele vento tocar levemente a face e me lembrar as alturas chapadinas.
Foi um dia para olhar os prédios submersos e a dança frenética dos galhos das árvores que sonham em tomar uma direção, mas são impedidos pelas suas raízes.

Hoje foi um dia de muito trabalho para os semáforos que, enamorados, piscavam amarela e desesperadamente para os automóveis.
Mas também para as formigas aladas que fugiam dos pingos céleres.
Hoje foi um dia de ascensão das cigarras e sua orquestra estonteante e também foi um dia de queda das folhas amarelas.
Do chão brotavam essências como uma virgem que, arada e penetrada por um homem, germinou
Hoje foi um maravilhoso dia de chuva...

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Leiam: Henry & June de Anaïs Nin


"Você carrega consigo um reflexo meu, uma parte de mim. Eu sonhava com você, desejava sua existência. Você sempre será uma parte de minha vida. Se eu a amar, deve ser porque partilhamos em alguma época dos mesmos pensamentos, da mesma loucura, do mesmo estágio."
(Parte do diário de Anaïs Nin. Ela fala sobre a sua paixão avassaladora pela femininidade demoníaca de June)

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O que vem depois dos 34?



Evidentemente, o número 34 se refere à quantidade de anos que possuímos. A resposta mais óbvia para o questionamento é: 35 anos. Pois é, em junho de 2010, estava refletindo sobre a minha condição no mundo ao completar esta idade e, após algumas leituras em revistas especializadas em psicanálise e algumas conversas na mesinha de um bar, cheguei à conclusão de que estou em crise. Eureca! Pois é, crise das brabas! Gostaria de dividir meus pensamentos com aqueles que se encontram no mesmo porão, escrevendo sob o ponto de vista masculino, pois, o que tenho para dizer não deve se enquadrar no universo feminino, já que, dizem, as mulheres amadurecem mais cedo que os homens, possuem interferências hormonais diferentes das nossas e, no final das contas, não sou um conhecedor do olhar feminino como gostaria de ser.
Quando nós homens chegamos aos trinta e cinco anos, a impressão que dá é a de que chegamos ao limiar, ao limite entre uma vida que já era e outra que vai começar, só que ladeira abaixo. É como se houvesse a passagem de uma dimensão à outra. Olhamos para trás e temos a convicção de que todo o tempo que passou – afora os momentos de alegria – foi em vão, que tudo ainda está por ser construído. É como se acordássemos numa segunda-feira após um domingo aprazível, cheio de diversão, e nos mandassem tirar a bermuda e o chinelo e botar as calças e os sapatos apertados. É o despertar para uma realidade que, só de pensar, dá medo. “O que vou e como vou decidir?” e “estou certo sobre o que eu quero?” são as perguntas mais freqüentes e mais complicadas para se obter a resposta. E nos enrolamos mais e mais quando achamos que possuímos a mais correta.
Acredito que passar dos trinta e cinco é estar entre duas crises: a primeira é a chamada “crise dos vinte e poucos anos”, que, segundo psicanalistas, é mais comum entre os homens com mais de trinta anos do que pensamos. É quando rimos com mais vontade, mas também choramos com menos lágrimas e mais dor, aprisionando nosso sentimento para mostrar que somos homens feitos. É com trinta e cinco anos que, ao virarmos a cabeça para as costas, descobrimos que deixamos passar o grande amor de nossa vida – até então! –, pois ele foi trocado por caprichos e escolhas estúpidas e peterpanianas, e que não temos mais certezas sobre se é bom amar e se caberá outro amor algum dia dentro de nosso coração empedrado. É, ao mesmo tempo, o momento em que queremos constituir família e miramos os nossos desejos para o aparecimento de um rebento, para podermos, enfim, ensinar a alguém o que aprendemos com nossos pais e nele depositar todo crédito e (por que não?) todas as frustrações. É o triste momento em que cai a ficha sobre a profissão em que nos enfiamos e que, parece-nos, não há mais tempo para mudarmos para outra, e, se há, já não temos mais tanta força para nos desfazer dos nossos hábitos.
No day after da comemoração do meu trigésimo quinto aniversário me deu vontade de voltar tudo de novo e me ver novo de novo. Poucas vezes na vida, penso, um homem pode se observar no espelho tão cruamente (e cruelmente) no fundo dos olhos e constatar a influência do tempo. E o tempo, que antes dos trinta e cinco parecia um aliado, torna-se um dos nossos tantos algozes (um vampiro, suponho). Um pessimista diria que já passamos da metade da vida; um otimista reclamaria: calma lá, ainda falta dois anos e alguns meses, se você estiver se cuidando bem! Nessa idade já não nos achamos tão novos, mas, também, não nos achamos tão velhos. E aí, a vaidade, mesmo que com os pés no chão, corre solta, afinal, temos que fazer uma viagem proustiana e ir à busca do tempo perdido.
Entender isso é começar a se preparar para a outra crise que ora se aproxima e já dá para sentir as suas fisgadas: a “crise da meia idade”. É crise atrás de crise! Haja estrutura psíquica para suportar tanta masturbação psicológica... Esta “crise seria mais uma peça no processo descrito pelo psiquiatra suíço Jung como metanóia (palavra grega que significa "mudança"), o que se dá a partir da confrontação do indivíduo com o "envelhecer" e, por conseguinte, com a ideia de ser finito” (Revista Psique, nº62). Ao estar entre as duas crises, a sensação é a de que quando descobrimos as respostas, a vida mudou as perguntas... E tome noites de insônia! E tome Rivotril. E tome cremes para retardar o envelhecimento e esconder as olheiras. É como se nós estivéssemos na pele do protagonista de Beleza Americana (muito interessante e instrutivo!), quando ele descobre que sua vida toda foi o que, parafraseando Manuel Bandeira, poderia ter sido.
Pois é! Quem está passando por um momento de cruzamento de crises como o dos trinta e cinco anos sabe a barra que é... Amadurecer não é fácil, porém é necessário. Só me lembra o filme Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, de um dos meus atores/diretores preferidos, Woody Allen. A cena final trata de uma peça teatral dirigida pelo personagem de Allen em que um casal obtém êxito em seu relacionamento amoroso, bem diferente do que havia ocorrido com ele. E Allen termina o filme dizendo: “O que você quer? É a minha primeira peça. Sabe, você sempre tenta fazer tudo sair perfeito na arte, porque na vida real é mais difícil”.
A todos os que estão experienciando este perrengue existencial, vai uma dica dos terapeutas e das nossas queridas avós: tudo passa... Dói, atrapalha, mas não é impossível de contornarmos. É hora de sairmos do cinema e trilharmos o caminho da alfinetante realidade. Cabe a nós encarar com peito erguido e muita coragem todo este turbilhão de coisas e “transformar as intempéries em halteres”, como disse o velho e bom cinquentenário Lobão. Afinal, estamos todos “vivendo e aprendendo a jogar. Nem sempre perdendo nem sempre ganhando, mas, aprendendo a jogar”!